Força Jovem no Campo
FORÇA JOVEM NO CAMPO
A reportagem de capa do Caderno Campo e Lavoura do Jornal Zero Hora do último dia 26/07/2013 trata da nova tendência dos jovens de família com tradição na atividade agropecuária, que optam por retornar as suas origens e dedicar-se aos negócios familiares. Destaca ainda a reportagem que não se tratam de casos isolados, mas sim de uma nova tendência motivada pela pujança das supersafras, pela crescente produção animal e pela elevação da geração de riqueza com a consequente elevação dos índices sociais e econômicos. São citados casos bem sucedidos de alguns jovens que, segundo relatado, estão integrados nos negócios da família, administrando e/ou contribuindo para o gerenciamento das propriedades.
Essa nova tendência deve ser saudada e até estimulada, porém nossa longa experiência no convívio com as famílias ligadas às atividades agropecuárias nos mais diversos rincões de nosso estado e fora dele, encaminhando processos sucessórios, nos autoriza a fazermos algumas observações a respeito. Por melhor que seja o relacionamento entre pais, filhos e irmãos, o inevitável choque de gerações e as explícitas ou não disputas de poder e liderança entre o sucedido e o sucessor, ou mesmo dos sucessores entre si, jamais devem ser ignoradas ou postergadas, mas sim administradas.
Sabemos que tradicionalmente a atividade agropecuária é explorada em nome da pessoa física do proprietário e administrada na forma de uma estrutura puramente patriarcal, que é um tipo mais puro de dominação tradicional carismática calcada na lealdade e na solidariedade de interesses entre líder e demais membros, e aqui não se está julgando se a forma é boa ou má, mas apenas constatando sua existência.
O que não se pode ignorar são os dilemas relativos aos pais-sucedidos e aos filhos-sucessores. Em relação aos primeiros, estão prioritariamente relacionados com a dualidade vida-morte, enquanto os dos filhos-sucessores estão centrados na questão de legitimação pessoal. Por dilemas se entende a vivência de certas situações complexas ou embaraçosas que exigem saídas difíceis ou penosas, que por vezes deixam os envolvidos sem possibilidade de escolha satisfatória, mormente em razão de que a abordagem de pais e filhos em relação à sucessão é distinta.
Para que os negócios familiares agropecuários possam ter êxito em longo prazo é fator determinante que a “passagem do bastão” que irá acontecer mais cedo ou mais tarde seja feita no momento certo e com acompanhamento de profissionais especializados, porque o negócio poderá perpetuar-se ao longo do tempo, mas o mesmo não acontecerá com seus gestores. Não podemos ignorar que a questão sucessória envolve a transferência de poder diretamente entre pais e filhos, principalmente aqueles que estejam em atuação simultânea dentro da “empresa”, e envolve fatos e ambiguidades de parte a parte que tendem a tornar essa transição mais complexa em razão dos inevitáveis fatores emocionais envolvidos.
É muito difícil para alguém que construiu ao longo de sua vida um negócio e um patrimônio fazer uma apreciação profunda de suas realizações, de seu ciclo de vida, do seu processo de envelhecimento e da eminente transferência de poder aos seus sucessores. Somente para destacarmos o nível de insegurança que o processo pode gerar no sucedido, relatamos a surpreendente pergunta de um sucedido quando fazíamos a sensibilização para iniciarmos seu processo sucessório, quando nos questionou: “É para sempre?”
Esse processo é muito complexo e em alguns casos com fases intransponíveis quando o sucedido, já envelhecido, como se lutasse pela própria sobrevivência, agarra-se de tal forma ao poder estratégico do negócio a ponto de inviabilizar o processo de sucessão. Nesses casos o filho-sucessor, que deveria ser visto como um parceiro, é percebido pelo pai como uma potencial ameaça ao seu posto, causando-lhe confusão e sofrimento.
O filho sucessor, por sua vez, reluta em consolidar sua identidade como novo líder ao deparar-se com a fragilidade por vezes física e mental por conta do envelhecimento do pai-sucedido. As duas situações causam grande expectativa de transferência de gestão e são potencialmente prejudiciais ao negócio, exigindo um estudo de cada caso, que é fundamental ao êxito de um bom processo sucessório.
Os mais de vinte anos que trabalhamos com os processos sucessórios nos permitem afirmar que embora existam similaridades entre cada um deles, cada um tem características próprias que o diferenciam dos demais. São todos processos contínuos e quando nos perguntam quantos processos sucessórios resolvemos, respondemos: Nenhum, mas encaminhamos muitos.
Sidnei Peres Gonçalves
Contador e Advogado
Diretor da Affectum Auditoria e Consultoria Empresarial
Diretor da SPGonçalves Advocacia