Royalties da Monsanto
Ricardo Paz Gonçalves Ricardo Paz Gonçalves

Royalties da Monsanto

Publicado em 31 de agosto de 2015

Batalha judicial com agricultores tem novo capítulo

Foi amplamente noticiado na imprensa a recente decisão de uma Vara Judicial de Porto Alegre que deferiu uma medida liminar requerida pela APROSOJA-RS para suspender os efeitos do acordo de licenciamento de tecnologia proposto pela Monsanto, relativamente a RR2 PRO, e ainda obstar nova cobrança após a primeira aquisição das sementes da multinacional.

Atualmente essa decisão desafia um agravo de instrumento interposto pela Monsanto, o qual aguarda julgamento no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Não pretendemos com o presente artigo abordar, com profundidade, a questão jurídica por traz desta matéria, que, diga-se de passagem, é de assaz complexidade mesmo para os mais habituados operadores do direito.

Ao contrário disto pretendemos nos dirigir aqueles que, sabedores das notícias, tem ansiosa e reiteradamente nos procurado para buscar orientações e aconselhamento: os produtores rurais.

Tenho visto nos produtores com quem convivo uma certa conformidade com os preços praticados e a contrapartida recebida por eles em face dos produtos comercializados pela Monsanto. De toda sorte, é natural que uma vez comprovado que a multinacional tenha eventualmente infringido direito deles, busquem pela respectiva reparação.

Apostar em uma tese judicial exige responsabilidade e zelo por parte daqueles que empreendem tal intento. Sobretudo considerando-se a redação do novo Código de Processo Civil, lei recentemente promulgada que passará a viger em março de 2016 e que imporá aos vencidos nas ações judiciais o dever de pagar ao advogado da parte vencedora a título de honorários de sucumbência um percentual arbitrado pelo juiz que irá de 10% a 20% do valor da causa, condenação ou proveito econômico obtido pelo vencedor.

A causa envolvendo os royalties da Monsanto poderá resultar em honorários de sucumbência gigantescos em prol dos advogados da multinacional, e consequentemente em prejuízos de igual monta aos produtores. Vale lembrar ainda que os valores não pagos a empresa por força de liminar, devem ser restituídos acrescidos de juros na hipótese de posterior revogação das liminares. Evidentemente que em caso de ganho os lucros serão proporcionais.

Postas estas variáveis alguns fatores me levam a crer que, ao fim, não lograrão êxito as ações que contestam os royalties cobrados pela Monsanto. Os principais são:

1) Existem precedentes jurisprudenciais que claramente afastam os principais argumentos esposados pela ação em questão;

2) Os argumentos trazidos na ação e os utilizados pelo magistrado que concedeu a liminar em questão, com todo o respeito, parecem ser excessivamente subjetivos e em descompasso com a linha de pensamento reinante nos Tribunais Superiores;

Abstraindo-se a questão do conflito entre a lei de patentes e a lei de cultivares, os principais argumentos da ação e da liminar judicial mencionada referem-se a uma suposta abusividade na cobrança dos royalties. O argumento para afastar o acordo de licenciamento, por exemplo, seria de que ou o adquirente o aceita ou fica impossibilitado de adquirir o produto. Isso justificaria, segundo a decisão, o direito de o adquirente recorrer ao judiciário para que esse interfira no contrato e arbitre uma relação mais “justa”, pois o acordo é “imposto”.

Me questiono, frente a este argumento, qual o poder que temos para questionar ou negociar os preços e condições ofertados pelas prestadoras de serviços de telefonia, fornecedores de energia elétrica, vendedores de combustível, etc. Ou seja, o argumento serviria para contestarmos um sem número de contratos e relações que estabelecemos no dia a dia e ao cabo levaria a uma insegurança jurídica extrema.

Tal posicionamento parece pressupor a existência de um direito fundamental à aquisição de semente de soja transgênica. Quando em realidade, aquele que eventualmente considerar o produto excessivamente oneroso, como alega a ação, tem ampla liberdade para não o adquirir.

Por tais razões não creio no êxito de tal tese jurídica, reiterando meu respeito pelos autores da ação e pelo magistrado que proferiu a referida decisão. Indo mais além não creio que seja bom para o nosso ambiente de negócios que o judiciário interfira de tal forma nas relações entre particulares (contratos).

Esse mesmo viés intervencionista e protecionista que pode ora beneficiar produtores, é o que em outras circunstâncias os prejudica em decisões que relativizam o direito de propriedade (caso do movimento “sem terra”) ou praticam atrocidades jurídicas em prol da proteção do hipossuficiente na Justiça do Trabalho.

Ricardo Paz Gonçalves

Sócio Diretor da Affectum Consultoria

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