O direito de preferência na venda de imóveis em condomínio
Julgamento recente do STJ uniformizou entendimento sobre direitos de condôminos e compradores
É bastante frequente o estabelecimento de condomínios envolvendo, sobretudo, imóveis rurais. A razão do estabelecimento destes condomínios está muitas vezes ligada as dificuldades em se estabelecer divisão cômoda entre os herdeiros de um determinado imóvel. As particularidades burocráticas e tributárias envolvendo a divisão de terras particulares (extinção de condomínios) e os sucessivos negócios realizados por meio de contratos particulares ou escritura sem a devida regularização das matrículas, também contribuem para esse cenário.
Nestes condomínios, por quaisquer razões estabelecidos, é frequente que um condômino queira vender seu quinhão a terceiros. Em se tratando da mistura de relações familiares, de negócios e de vizinhança, a relação entre os condôminos nem sempre é das mais amistosas, e sempre existe a dúvida sobre a necessidade de se ofertar aos demais condôminos e direito de preferência para aquisição da fração posta a venda em igualdade de condições com terceiros.
Para responder a esta questão, em conformidade com o recente entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é a mais alta Corte do país com autoridade para julgar essa matéria, é preciso fazer a distinção entre dois critérios de classificação relativos à divisibilidade do imóvel.
Primeiramente há de se distinguir o imóvel divisível do indivisível. Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam. Os demais, por exclusão, consideram-se indivisíveis. Imóveis rurais, de regra, são bens divisíveis. As exceções ocorrem quando a divisão acarretar parcela inferior ao módulo rural regional ou quando peculiaridades ambientais ou produtivas excepcionais justificarem tal conclusão.
Em segundo lugar há de se analisar se o condomínio encontra-se dividido ou em estado de indivisão. Chamamos condomínio pro-diviso quando os condôminos exercem posse individual de cada uma de suas áreas ideais, com exclusividade e delimitação pública, ao passo que no condomínio pro-indiviso pende de divisibilidade fática a coisa comum, não sendo possível dizer qual a direito de cada condômino dentro do todo maior.
Imóveis indivisíveis
Em se tratando de imóveis indivisíveis o condomínio, por lógica, será sempre pro-indiviso. Mas em se tratando de imóveis divisíveis o condomínio poderá ser pró-diviso ou pró-indiviso. Nesta última hipótese, apesar de a divisão ser possível, por uma circunstância qualquer como a falta de consenso entre os condôminos, a divisão de fato ainda não ocorreu.
Pois bem, nestes casos a lei determina que não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer esse direito no prazo de cento e oitenta dias.
No caso do bem indivisível, portanto, não restam dúvidas quanto ao direito de preferência do condômino. Já no caso do bem divisível a dúvida recai sobre aqueles casos em que embora o bem seja divisível, encontra-se em estado de indivisão (condomínios pró-indivisos). Os juristas e os Tribunais divergiam há muitos anos acerca desta hipótese.
Decisão do STJ
A recente decisão do STJ pacificou o entendimento de que no caso de condomínios pró-indivisos o condômino que desejar vender sua parte a estranhos deverá oferecer aos demais o direito de preferência. Por exclusão, em se tratando de condomínios pró-divisos esse direito não assistirá aos demais a quem não seja ofertado o direito de preferência. Resumindo tudo temos o seguinte cenário:
Imóvel é divisível | Está dividido de fato | Direito de preferência |
SIM | SIM | Não existe |
SIM | NÃO | Existe |
NÃO | NÃO | Existe |
Estas são as três hipóteses, que podem ser resumidas dizendo que somente na hipótese de se tratar de condomínio dividido de fato é que não haverá o direito de preferência no caso de pretender um dos condôminos alienar o imóvel comum a terceiros.
Vale por fim ressaltar dois tópicos, embora não sejam estes temas tratados no presente artigo: i) que existem outras hipóteses de direito de preferência tratados na legislação que independem das circunstâncias aqui mencionadas, como nos casos de imóveis em inventário e daquelas previstas no estatuto da terra; e ii) que é importante não confundir direito de preferência com direito de primeira oferta, erro corrente entre vendedores que nestes casos pretendem desincumbir-se do ônus do direito de preferência simplesmente oferecendo previamente o bem a seus condôminos.
Ricardo Paz Gonçalves